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Namoro simples ou qualificado? O Dia dos Namorados nos tempos dos contratos

Embora o contrato de namoro gere presunção relativa de inexistência de união estável, ele não é absoluto. Se ficar demonstrado que, na prática, o casal vivia como se casado fosse, o contrato poderá ser desconsiderado judicialmente

  • Alexandre Dalla Bernardina É advogado
Publicado em 10/06/2025 às 15h51

O namoro é um vínculo afetivo livre e descompromissado, que não gera, por si só, efeitos patrimoniais ou sucessórios entre as partes. Trata-se de uma relação pautada pela informalidade e pela ausência de compromisso jurídico com a constituição de família.

Por outro lado, a união estável é reconhecida como entidade familiar pela Constituição Federal (art. 226, § 3º), caracterizando-se pela convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, com o objetivo de constituição de família. Dessa relação decorrem direitos e deveres recíprocos, inclusive efeitos patrimoniais em caso de dissolução ou falecimento de um dos conviventes.

No entanto, a linha divisória entre namoro e união estável, mutas vezes, é tênue. A jurisprudência e a doutrina aram a identificar duas categorias dentro do próprio conceito de namoro: o namoro simples e o namoro qualificado.

O namoro simples é comum entre pessoas mais jovens e caracteriza-se por um vínculo afetivo leve, com convivência esporádica e menor envolvimento nas esferas familiar e patrimonial. Já o namoro qualificado é mais frequente entre adultos, muitas vezes divorciados ou que já vivenciaram uniões estáveis anteriores, que envolve relações mais profundas e duradouras, com partilha de momentos sociais, viagens e projetos em comum. Entretanto, no namoro qualificado não há intenção de constituição de uma nova entidade familiar.

Nesses casos, os parceiros podem até compartilhar imóveis de lazer, frequentar eventos familiares ou mesmo coabitar por períodos curtos. No entanto, geralmente mantêm domicílios próprios, não assumem obrigações parentais com os filhos um do outro e não organizam suas vidas em moldes conjugais. O relacionamento se dá no plano afetivo e pessoal, sem os compromissos típicos de uma união estável.

A distinção entre união estável e namoro qualificado é, portanto, delicada e complexa, exigindo análise criteriosa do caso concreto. O elemento central para essa diferenciação é a intenção de constituir família, que se manifesta por meio de comportamentos objetivos: apresentação social como se casados fossem, formação de um lar comum, rotina doméstica compartilhada, existência de filhos, contas conjuntas, dependência em planos de saúde, entre outros indicativos.

Diante desse cenário, surge a figura do contrato de namoro, instrumento jurídico por meio do qual as partes expressam a ausência de intenção de constituir família, afastando a caracterização de união estável e os efeitos jurídicos dela decorrentes.

Esse contrato tem sido analisado pelo Poder Judiciário, como no recente julgamento do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. No caso, a Corte rejeitou o pedido de reconhecimento de união estável entre um casal que conviveu de 2016 a 2018, justamente com base na existência de contrato de namoro firmado pelas partes. A decisão foi unânime.

O TJPR considerou válido o contrato firmado por namorados, com reconhecimento de firma e assistência de advogados, afastando alegações de vício de consentimento. Também destacou a ausência de convivência duradoura e, principalmente, de intenção mútua de constituir família — elemento indispensável à configuração da união estável.

Dia dos Namorados
Dia dos Namorados. Crédito: Pixabay

Embora o contrato de namoro gere presunção relativa de inexistência de união estável, ele não é absoluto. Se ficar demonstrado que, na prática, o casal vivia como se casado fosse, o contrato poderá ser desconsiderado judicialmente, reconhecendo-se a existência de união estável com todos os efeitos jurídicos correlatos.

O contrato de namoro, portanto, não é um instrumento de blindagem absoluta, mas uma manifestação de vontade que poderá ser considerada pelo Judiciário como indicativo da real natureza da relação afetiva, especialmente em tempos em que os vínculos amorosos se revestem de múltiplas formas e intensidades.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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